Verdade e Araguaia
Na hora em que o Comando do Exército diz de novo que os papéis da ação da tropa no Araguaia foram queimados, saiu o livro “Mata! – O Major Curió e as Guerrilhas no Araguaia”, do repórter Leonencio Nossa.
Nele está o melhor levantamento já feito sobre o extermínio total e sistemático dos guerrilheiros, praticado depois de outubro de 1973.
É uma narrativa capaz de abalar o dia do leitor. Leonencio colheu depoimentos de 153 pessoas, muitos deles relacionados com a matança. Curió tem um pé na mitomania e alguns detalhes podem ser contestados, mas são minúcias.
“Mata!” descreve o assassinato de 30 militantes do PC do B ou de moradores que se ligaram a eles. Ele confirma a falsidade de três afirmações.
1) Os documentos relacionados com o Araguaia não desapareceram. Queimaram muitos, mas não todos. Leonencio identifica os oficiais que comandaram a matança.
2) O extermínio dos prisioneiros não foi obra de militares indisciplinados. Foi uma decisão de governo, tomada pelos presidentes e ministros do Exército da ocasião.
3) Aquilo não foi uma guerra, foi uma operação para apagar a memória. Em maio de 1945, havia 20 pessoas no bunker de Hitler. Sumiu só uma. No Araguaia eram 49, e sumiram todos.
Aviões lançavam panfletos convidando os fugitivos à rendição. Um deles dizia: “Oferecemos a possibilidade de abandonar a aventura com vida, com tratamento digno e julgamento justo”. Mentira.
Quem passar por uma livraria e tiver disposição (muita) pode sapear seis páginas (196 a 202) com a narrativa da captura de Aurea Valadão, de 24 anos, ex-estudante de física da UFRJ, e do camponês Batista.
Fonte: O Globo