União da Juventude Patriótica: Jovens contra a ditadura e o imperialismo
Trecho do documentário de Sílvio Tendler
Nasce a UJP
Existe uma visão equivocada sobre a política adotada pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB) no auge da ditadura militar. Muitos ainda acreditam que ele, especialmente após a decretação do AI-5, tivesse abandonado sua atuação no movimento de massas para se dedicar exclusivamente à luta armada.
De fato, o PCdoB empregou parte importante de suas energias na montagem da guerrilha rural, mas jamais abandonou a perspectiva de se inserir nas lutas sociais urbanas.
Foi, justamente, isso que o diferenciou da maioria das correntes revolucionárias que combatiam a ditadura militar, tornando-o numa força política expressiva – ao lado da Ação Popular (AP) – no interior movimento estudantil brasileiro. Este partido chegou a ter maioria na última diretoria clandestina da UNE (1970-1973). Particularmente no antigo Estado da Guanabara este crescimento foi mais sentido.
Neste artigo trataremos de uma das muitas das tentativas feitas pelo Partido Comunista do Brasil para se manter vinculado às massas juvenis no auge da truculência ditatorial (1969-1975). Refiro-me a experiência de construção da União da Juventude Patriótica (UJP).
Uma das pessoas indicadas pela direção do Partido para organizar essa entidade foi Myriam Ribeiro Costa, estudante da UFRJ. O PCdoB da Guanabara, afirmou ela, “destacou alguns quadros para participarem de uma Comissão Estadual Provisória, com o objetivo de construir uma agremiação revolucionária que congregasse os jovens independentes interessados e motivados em lutar contra o regime militar e pelas reivindicações populares (…). Durante l969 e no início de l970, reunimo-nos inúmeras vezes para discutir e elaborar o Programa e o Estatuto, que seriam o ponto de partida da empreitada”.
A decisão não foi fácil, pois existiram opiniões diferentes sobre como esta entidade deveria ser organizada: “quando discutíamos o Estatuto, chegamos a um impasse: a UJP deveria ser oficialmente subordinada ao PCdoB, por menção estatutária, ou ser dirigida por esse partido, sim, mas num quadro de autonomia política? Nesse ponto, solicitamos a presença do Comitê Regional. Não sendo resolvida a controvérsia, apelamos ao Comitê Central, que decidiu pela segunda alternativa (…).
Carlos Danielli ajudou a por um ponto final na controvérsia: a UJP deveria ser uma organização de frente única, dirigida pelo PCdoB, sim, mas por meio da eleição democrática de seus dirigentes, e não uma espécie de Juventude Comunista, de antemão vinculada a esse partido e oficialmente subordinada às suas decisões”.
Carlos Henrique Tibiriçá – ou simplesmente Caíque – começou a se aproximar da esquerda em 1966, ficando dividido entre o PCdoB e a Ação Libertadora Nacional (ALN). Contudo, quando da decretação do AI-5, ele optou por se vincular definitivamente ao primeiro.
Enquanto comunista e militante do movimento estudantil, participou ativamente do processo de construção da UJP e compôs a Comissão Estadual, ficando responsável pelo setor secundarista. Este, por sinal, foi um dos setores mais ativos daquela organização, até ser destroçado pela repressão pouco tempo depois.
Numa entrevista ao autor, Caíque esclareceu que “a criação da UJP (…) era parte de uma experiência que se desse certo na Guanabara seria paulatinamente estendida aos demais estados (…).
As primeiras discussões sobre a criação da UJP que participei, foram com Jover Telles, Armando Frutuoso, Lincoln Bicalho Roque e o assistente do meu setor, que era o José Roberto Brum de Luna, todos dirigentes do Comitê Estadual, os três primeiros também do Comitê Central”.
Assim, em março de 1970, foi fundada a União da Juventude Patriótica e para se filiar a ela não precisava ser comunista ou marxista-leninista. Bastava ser antiimperialista e contra a ditadura militar. O seu estatuto afirmava que ela se constituía numa “organização revolucionária de jovens patriotas e democratas, sem distinção de raça, classes, princípios ideológicos, religiosos e filosóficos”.
O seu objetivo era “mobilizar, unir e organizar os jovens cariocas na luta pela derrubada da ditadura militar que infelicita nossa pátria, pela libertação do Brasil do jugo do imperialismo norte-americano e pela extinção do latifúndio; pela conquista de um governo verdadeiramente democrático e popular que assegure à juventude e a todo o povo brasileiro um regime de liberdade, progresso, cultura e um mínimo de vida digna”.
A entidade se organizava através de núcleos dos quais participavam entre 3 e 5 jovens. Estes núcleos se estruturavam clandestinamente por local de trabalho, setor profissional, de estudo, de moradia, esportivo e de diversão.
Seus membros usavam “nomes de guerra” e os diversos núcleos não podiam ter relações horizontais entre si. Era uma estranha mescla de entidade de massas que ao mesmo tempo era clandestina. Uma fórmula que já sinalizava para dificuldades futuras.
Da primeira direção da UJP participavam: Lincoln Bicalho Roque (Mário), como secretário político; Myriam Ribeiro Costa (Mariana), como secretária de organização e de imprensa; Carlos Henrique Tibiriça (Artur), responsável pelo setor secundarista.
Havia ainda duas outras pessoas cuja identidade ainda não se tem certeza. Lincoln Bicalho, segundo Caíque, “era um dirigente preparado, formulador, organizador, sempre parceiro de todos os militantes.
Muito querido por todos os que o conheceram. Sua atuação foi fundamental para que a UJP se consolidasse. Atuava com desprendimento e alegria”. Ele tinha ingressado no PCdoB após o golpe de 1964 vindo de uma importante dissidência do PCB na Guanabara.